sexta-feira, 29 de outubro de 2010

PESADELO



Ontem à noite,
quando me vi sobre o espelho:
uma imagem estampada, sem cor, sem nervos,
sem espaços;
senti profundamente a alma a perfurar-me os olhos
e a vomitar o sangue sobre os meus sapatos.


Meus dedos se crisparam e, tesos como o ferro,
tentaram, ainda assim, mover o meu desgosto.
os meus braços,
os meu tronco,
os hemisférios -
meus lábios que calavam e feriam a si mesmos.


Ontem à noite,
quando o guardião tocava flauta
e do céu choviam gotas de fel e carmim,
o arcanjo, o pirilampo, o demo e a toutinegra,
todos voavam loucos por dentro de mim.
E dentes, largos espetos, espinhas, florins.
iam pouco a pouco me dilacerando,
me rasgando o peito,
tocando o meu sexo,
cuspindo em meus pés.


Ontem à noite,
Quando a madrugada me encontrou envolto
nessa baba grossa, nessa dor-demência
desse desafio, sem poder viver;
soltei meu grito alienado,
que, ressoando intenso, envolvendo tudo,
ia corroendo os sonhos e presságios
como se quisesse em desespero libertar a paz
e dizer , firme e sem receios,
que ainda existe algo eternecido,
como um brado doce a reencetar a vida.
Ecoando, erguido, sobre os condenados e proscritos.
Dizendo, falando alto, apregoando
Que apesar de tudo, mesmo amordaçado,
Eu amo vo
cê!

(Costa Pinto)

(imagem extraída do site:"projetotecnologia.pbworks.com")

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