Vila dos prosélitos, um multifacetado lugarejo de diversas religiões, vivia em paz por haver tolerância e principalmente respeito entre seus moradores.
Um
dia, a paz do lugarejo foi afetada pela obsessão de um seguidor da Egocêntrica,
uma religião de acirrados. A obsessão consistia em que todos seguissem os
egocêntricos, assim eram conhecidos os seus seguidores.
Esse
seguidor chamava-se Egoísta, considerava-se um verdadeiro profeta dos tempos
atuais, dizia-se salvo e condenava a todos os que não o tivessem como exemplo.
Acreditava falar com os anjos e que isso fazia dele um homem puro. Ameaçava as
crianças alheias na intenção de que assim aceitassem sua fé: - Se seu filho
ficar à beira da morte, você acreditará em mim.
Havia
uma mulher, Dona Dúvida, humilde, de boa índole, que vivia bem com todos,
talvez por ter passado por tudo nessa vida. Ela não seguia nenhuma religião,
nem ocupava Deus com pedidos tolos. Porém, diante da ameaça de dispersão de
seus vizinhos, arriscou pedir a Deus que fizesse alguma coisa, por exemplo,
levar o Sr. Egoísta para o céu; diante disto, estaria tudo resolvido.
Não
querendo Deus o Sr. Egoísta ao seu lado, fato esse desconhecido pelo mesmo,
resolve ter uma conversa com ele.
Aparece
Deus ao raiar do sol, como se fosse um humilde ancião, seguidor da Aceitação, e
cumprimenta o Sr. Egoísta: - Que a Aceitação nos salve. Ele o tratou com
extrema frieza, foi grosseiro, tentou desvencilhar aquele ancião de sua intensa
fé. Diante disso, muda Deus, a sua forma por diversas vezes, passando por todos
os tipos de membros de todas as religiões, com seus trajes e suas maneiras de
cumprimentar, até tornar-se um Egocêntrico e fala ao Sr. Egoísta: - Sou teu
Deus.
Surpreso, assustado e ao
mesmo tempo maravilhado, o Sr. Egoísta se envaidece e fica cheio de si, por ter
sido escolhido para falar com Deus, e pensa consigo mesmo: “Bem que eu dizia
a todos, isso prova que eu estava com a verdade.”
Lendo
Deus o seu equivocado pensamento, fala-lhe novamente: - Egoísta, tu tens
boas intenções, porém não queiras o meu lugar. Lúcifer, já foi um anjo meu.
Lembre-se disso. Por que queres todos seguindo a ti, para chegar até mim? Sabes
tu que não podes condená-los e muito menos salvar a si próprio. Não se antecipes
a mim.
O Sr.
Egoísta ainda tenta justificar-se: - Senhor,
eu apenas queria ser exemplo para eles.
Deus o
interrompe com rispidez: -
Homem, os teus passos foram de perfídia e solidão, até o dia em que me
encontraste em seu próprio coração. Não precisaste de nome para me definir, nem
de representantes para me falar e muito menos de exemplo para me seguir.
Já
desesperado, o Egoísta ajoelha-se e roga: - Senhor, não me abandones, eu não
sabia o que fazia.
Deus estende a sua mão
direita e aponta o indicador para o Sr. Egoísta, ao mesmo tempo em que fala: -
Não temas, és a minha forma e semelhança, e como tal és passível de erro. És
condenado, não pelos teus atos, mas pelo que és, um mortal.
Olhando as costas daquele
ancião que partia, assim como chegara, trajado como um humilde seguidor da
Aceitação, o Sr. Egoísta decide repensar a sua fé.